quinta-feira, 16 de outubro de 2008

...e continua o vazio muito bem complementado !!

Era uma vez... numa terra muito distante...uma princesa linda, independente e cheia de auto-estima.
Ela se deparou com uma rã enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo era relaxante e ecológico...
Então, a rã pulou para o seu colo e disse: linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito.
Uma bruxa má lançou-me um encanto e transformei-me nesta rã asquerosa.
Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo.
A tua mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavar as minhas roupas, criar os nossos filhos e seríamos felizes para sempre...
Naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria, pensando consigo mesma:
- Eu, hein?... nem morta!

Luiz Fernando Veríssimo

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

A encher minha falta do que fazer...

Se eu fosse um padre


Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
- muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,


não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,


Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!


Porque a poesia purifica a alma
... a um belo poema - ainda que de Deus se aparte -
um belo poema sempre leva a Deus!

(Mário Quintana)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

A esconder meu ócio, minha falta do que dizer:

AOS MEUS FILHOS

Na intermitência da vital canseira.
Sois vós que sustentais (Força Alta exige-o...)
Com o vosso catalítico prestígio,
Meu fantasma de carne passageira!

Vulcão da bioquímica fogueira
Destruiu-me todo o orgânico fastígio.
Dai-me asas, pois, para o último remígio,
Dai-me alma, pois, para a hora derradeira!

Culminâncias humanas ainda obscuras,
Expressões do universo radioativo,
Íons emanados do meu próprio ideal,

Benditos vós, que, em épocas futuras,
Haveis de ser no mundo subjetivo,
Minha continuidade emocional!

(Augusto dos Anjos)

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Para...você sabe quem, menina !

Você me escuta.
Eu te procuro surdo, surdo.
Você já me sente, eu nem acredito ainda.
Você já chora. Só sei que isso eu sei !
Te imagino e você sabe-me todo, danadinha !
Você nem faz aniversário ainda, e eu só penso nos teus presentes.
Você dorme e eu penso por você.

Quero abrir todas as portas
Para que levemente você passe por aqui, levemente sorria, levemente viva;
Levemente ilumine.

Já me sabe, me conhece, é um pedaço meu que nem sei ainda
Quero o resto da vida a conhecer-te.

Perdoa a falta de talento do teu pai, sem rima, sem métrica, sem poesia, sem estética.
Devo ter gastado todo meu estoque ao gerar-te.

Quero apenas que faça as contas: se o que vale é a intenção, some a isso o fato de que você foi a coisa mais bem intencionada que já fiz.

Sei que você aí dentro já sonha, então faça-me o favor:

Sonhe com os anjos, criança.
Sonhe comigo, anjo.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Augusto dos Anjos

Para preencher meu recesso, muito melhor do que eu faria:

AGONIA DE UM FILÓSOFO (Augusto dos Anjos)


"Consulto o Phtah-Hotep. Leio o obsoleto
Rig-Veda. E, ante obras tais, me não consolo...
O Inconsciente me assombra e eu nele rolo
Com a eólica fúria do harmatã inquieto!

Assisto agora á morte de um inseto!...
Ah! todos os fenômenos do solo
Parecem realizar de pólo a pólo
O ideal de Anaximandro de Mileto!

No hierático areópago heterogêneo
Das idéias, percorro como um gênio
Desde a alma de Haeckel á alma cenobial!...

Rasgo dos mundos o velário espesso;
E em tudo igual a Goethe, reconheço
O império da substância universal!"